terça-feira, 11 de outubro de 2011

'Ser gordo parece defeito de fábrica', diz mulher que deixou emagrecedor

Ângela Campos chegou a tomar dois remédios, mas hoje busca saúde.

Ângela Maria do Couto Campos já fez todo tipo de dietas e gastou muito dinheiro com remédios para tentar emagrecer. “Ser gordo parece defeito de fabricação”, disse a comerciante que mora em Belo Horizonte e preferiu não comentar sobre o peso atual. Aos 43 anos, Ângela afirma que já não se preocupa tanto com o corpo como na juventude. “Hoje, olho para o espelho e penso: ‘quer, quer; não quer, não quer!’ Já curti muito a vida”, diz.


Após sessões de terapia, Ângela diz que passou a acreditar que “remédio não resolve nada”. Nesta segunda (10), o governo federal publicou no "Diário Oficial da União" a proibição de três emagrecedores e a exigência de maior controle sobre a sibutramina.
“Eu respeito minha condição física. Eu sou gorda. Isso é uma agressão, querer ser o que eu não sou. Não sou o tipo de pessoa que nasceu magra e foi engordando por algum motivo. Meu biotipo é de gordinha. Quem nasce gordo e quer ser magro é contra a lei da natureza. Não adianta querer ser Barbie”, confessou.
Para manter a saúde em dia, ela caminha durante cerca de uma hora quatro vezes por semana. “Se emagrecer, é lucro”, falou. A comerciante, que é divorciada e tem dois filhos, diz que não sente necessidade de acompanhamento médico, nem de um nutricionista.

“Quando o gordo se assume, começa a fazer refeições regularmente e a saúde melhora. Você começa a se policiar, não o remédio”. Ângela diz que, no caso dela, não vale mais a pena pagar pelos serviços destes profissionais. “Não vou mais a médico porque sei de cor os regimes”, disse.
Para a comerciante, a inquietação com a aparência começou cedo. Ela conta que tem seis irmãos e que eles sempre foram divididos em grupos de gordos e magros. “Todo mundo pensava: ‘coitados dos gordinhos’”, contou.
Aos 20 anos, quando conheceu o ex-marido, Ângela tinha acabado de perder 30 quilos em quatro meses. O “milagre” foi um tratamento de injeções intramusculares, que ficou famoso por volta de 1978 na capital mineira. “Com esse eu emagreci, fiquei linda, puro osso”, disse.
Na época, Ângela comparecia ao consultório e tomava uma injeção diária de uma substância que ela desconhecia durante um mês. “Eu ia lá, ficava 15 minutos e ia embora. A sala ficava lotada”, relembrou. “A injeção que ele dava no músculo queimava gorduras. Era caro, mas emagreci. Era o boom da época. Se ele estivesse vivo [o médico] eu iria lá de novo”, confessou.
Você fica linda, mas fica uma linda triste. Você cabe em qualquer roupa, mas sem vontade de viver”"
Ângela Maria, 43 anos, sobre
emagrecer com remédios
Antes desta tentativa, Ângela já havia apostado nas dietas da Lua e da proteína, que não foram muito eficazes, segundo ela. Durante o primeiro tratamento, a comerciante conta que tomava apenas líquidos durante os sete dias da fase da Lua minguante. “Emagreci mixaria”.
Já ao experimentar a dieta da proteína, Ângela conseguiu perder de cinco a seis quilos, mas também não aprovou o método. “Sentia uma fraqueza muito grande. Ficava nervosa. Não podia comer carboidrato, então comia carne, carne, carne”, diz.
Depois destas tentativas, a comerciante recorreu a remédios e já chegou a tomar sete comprimidos com vários compostos manipulados em um dia. “É uma forma rápida de emagrecer, é o milagre”, disse. No início, ela ficou satisfeita com o efeito. “Você olha para a comida e ela não olha para você”, completou. Após perder alguns quilos, ela conta que começou a “pensar com cabeça de magro” e que, além de voltar a engordar, passou a gastar muito dinheiro com acessórios que não podia usar antes. “O consumismo é muito grande. O magro pode comer tudo, comprar roupas. Qual gordo não quer fazer isto: entrar na loja e ver que a roupa serve?”, questionou.
Ângela diz que já chegou a tomar os remédios femproporex e sibutramina ao mesmo tempo. “O médico fazia uma receita no meu nome e outra no nome do meu irmão”, relatou. Segundo ela, a longo prazo, o resultado dos medicamentos foi negativo, pois trouxe sintomas de depressão. “Você seca, você fica linda, mas fica uma linda triste. Você cabe em qualquer roupa, mas sem vontade de viver”, observou.
Ela diz que, durante uma destas crises depressivas, acabou se divorciando. “Um problema simples se torna terrível. Não parava de chorar um minuto. Na hora em que você percebe, começa a ver que tem força para vencer. Na terapia, entendi que o remédio não faz milagre”, disse.
Além disso, Ângela contou que a cada vez que ia ao médico, voltava com mais caixas de medicamentos. “Você vai ao médico e ele pergunta: você está se sentindo bem? Aí você fala que não está conseguindo dormir, que está nervosa, com o intestino preso... aí, o médico joga outros remédios”.
Para ela, a restrição a remédios emagrecedores não vai ser eficiente. “O gordo vai achar em outro lugar. Este mercado é muito lucrativo”, falou.
Atualmente, Ângela se diz menos insatisfeita com a aparência. “Sou vaidosa, gosto de estar bonita, chamar a atenção. Não me escondo no ‘gordo’. Estou com 43 anos, mas até me acho gostosinha”, brincou.
Proibição não funciona
Para a nutricionista Cynthia Antonaccio, o caso de Ângela mostra como dietas baseadas na proibição não trazem efeitos duradouros. ”A pessoa pode até perder peso, mas não aprende a comer”, diz a especialista, diretora do Grupo Equilibrium, voltado para saúde e nutrição. “Não existe alimento bom ou ruim, o que importa é o conteúdo total da dieta.”
Ao pensar sobre as tentativas para emagrecer, Ângela mostra que não acredita em milagre. Um diagnóstico parecido com o da nutricionista. “A dica é: já que você testou todas as dietas, desista. É preciso ter disciplina para comer”, afirma a especialista. “Estabelecer horários para a alimentação, não comer toda hora, colocar porções adequadas.”
Os remédios também não podem servir de fórmula “mágica” para reduzir o peso. “Não sou contra os medicamentos, mas hoje o uso é muito abusivo, tem gente que sai com receita após 10 minutinhos de consulta”, diz. “O remédio é algo para ser usado temporariamente e junto com as técnicas de nutrição, não vai nunca substituir a boa alimentação.”
Uma alimentação ideal deve contar com horários regulares de comida. “É sempre bom tentar manter a rotina de café-da-manhã, almoço e jantar, com lanchinhos entre eles”, explica Antonaccio. “As pessoas precisam saber fazer escolhas mais adequadas e a consumir grupos de alimentos menos calóricos. Curtir uma boa salada, uma boa fruta.”
O médico Antonio Roberto Chacra, professor de endocrinologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), tem uma avaliação parecida sobre as dietas, como a da Lua. “Muitas vezes, aparecem dietas malucas com o mesmo princípio, que é comer menos uma vez por semana. Você emagrece, mas recupera o peso facilmente”, diz ele.
Chacra afirma que a depressão que Ângela sentiu com os remédios é um efeito conhecido do medicamento. “Depressão é normal, não só como efeito colateral. Ela pode ser também a causa da obesidade”, diz ele.
Para ele, os emagrecedores ajudam, sim, a perder peso – desde que sejam prescritos por um médico de confiança seguindo critérios rigorosos. Além disso, não é para tomar o remédio para sempre. A medicação deve ser apenas para dar um primeiro impulso – depois, o próprio paciente precisa aprender a controlar sua alimentação. “Há casos em que os remédios se justificam, sem dúvida. Mas têm que ser prescritos pelo endocrinologista, com critério. Não pode ficar tomando direto,” afirma.
Para ele, a reeducação alimentar é fundamental. “O efeito passa depois que a pessoa para de tomar o remédio, então ela sempre quer voltar e acaba viciando,” afirma. “A prevenção passa pela mudança do estilo de vida.”

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